Estreada em 26 de dezembro de 1830, em Milão (Teatro Carcano), na voz da grande Giuditta Pasta (1797-1865), a tragédia lírica de Donizetti foi elaborada sobre libretto em italiano de Felice Romani (1788-1865), baseado na obras de Ippolito Pindemonte e Alessandro Pepoli.
Anna Bolena inaugura ainda uma série de três óperas de Donizetti, inspiradas em personagens ingleses verídicos da dinastia Tudor, que enfocam especialmente três soberanas: além de Anne Boleyn, Mary Stuart, na ópera Maria Stuarda (de 1834), e Elizabeth I, na ópera Roberto Devereux (1837).
Apesar do sucesso inicial, a ópera praticamente saiu do repertório até a década de 50 do século passado, quando foi reabilitada e passou a integrar as temporadas líricas de diversos teatros, tanto na Europa quanto na América. Marcou época a produção de Luchino Visconti para Maria Callas, no Teatro alla Scala, em 1957, um dos grandes papéis da diva greco-americana. Interessante notar que a atual produção de David McVicar marca a estreia de Anna Bolena no MET, 171 anos após a sua primeira apresentação.
Uma das razões principais da qualidade da ópera reside no libretto bem delineado de Romani, que possibilitou a Donizetti imbuir as convenções da ópera italiana de então com profundidade psicológica e expressiva, especialmente em duetos como o de Anna e Jane Seymour no início do Ato II. Os diversos contrastes emocionais são amplamente destacados pela música, como bem demonstra o trio da 2ª cena do Ato II, (Fin dall’età più tenera) confrontando a ira de Enrico VIII, a indignação de Bolena e as reminiscências nostálgicas de Lord Percy.
A cena final, na Torre de Londres, é o ápice dramático-musical da ópera, culminando com a grande ária de Anna Bolena (Al dolci guidami...), com corne inglês obligatto. Numa extraordinária cabaletta de imenso virtuosismo, Donizetti encerra musicalmente o frenesi emocional que devasta a rainha, veículo ideal para a demonstração das qualidades vocais de um verdadeiro soprano drammatico d'agilità.
A interpretação de Anna Bolena, um verdadeiro tour de force, encontrou outras grandes artistas, além de Callas, em Montserrat Caballé, Dame Joan Sutherland (1926-2010), Leyla Gencer (1928-2008), Renata Scotto, Beverly Sills (1929-2007) e Edita Gruberova. A russa Anna Netrebko (que cantou o papel pela primeira vez neste ano, na Ópera de Viena) vem agora incluir seu nome no panteão das divas que deram vida, e voz, à trágica rainha de Donizetti, e da história.
Assista à performance eletrizante de Anna Netrebko na cabaletta da ária da loucura de Anna Bolena (Coppia iniqua...), no MET:
Anna Bolena at the Met with Anna Netrebko (Mad Scene) from Larry Murray on Vimeo.
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